Nosso Estado, nos últimos anos, vem ostentando índices
inimagináveis de violência – os homicídios, entre nós, são endêmicos –,
violência caracterizada como decorrente do crescimento desorganizado dos
centros urbanos, da erronia das políticas públicas e de múltiplos problemas
sociais. Teremos que minimizá-los para poder reduzir a níveis toleráveis este
tipo de criminalidade. Disso ninguém duvida. Atribuir, porém, a existência de
delitos apenas por conta da pobreza é uma cantilena antiga, usada, hoje, mais para
confundir do que explicar.
Em Alagoas, no entanto, sempre existiu uma outra violência,
escamoteada e protegida pelo Poder Público, a violência da criminalidade dos
poderosos que matavam e mandavam matar,
que surrupiavam os dinheiros e os bens públicos, que ameaçavam e constrangiam às
autoridades, que compravam, com pouca
monta, os seus serviçais, os bajuladores e os corrompidos, na mais absoluta
impunidade. E aí começa a história da 17ª Vara Criminal e a explicação do apoio
a ela pelos setores engajados e midiáticos.
A 17ª Vara aparece a partir da experiência da Central de
Inquéritos, criada para conter as intimidações desta criminalidade aos agentes
sérios que integravam o Sistema de Justiça Criminal. A expressão “Núcleo de
Combate ao Crime Organizado” foi dada pela imprensa, e sem erronia pois
qualquer anteparo destinado a desmantelar a delinquência, inclusive no
Judiciário, evidencia-se como um enfrentamento a ela e não aos acusados. É
estultice supor que, por conta da cognominação, os Juízes seriam imparciais e
uma espécie de longa manus da
polícia. No processo, o magistrado é um órgão suprapartes e qualquer
profissional da área conhece as exceções destinadas a enfrentar seu impedimento
e suspeição. A ideia da Central era decidir as cautelares nos inquéritos em que
figuravam estes criminosos, embora fosse necessário mais: o julgamento dos
crimes de powerful.
O Tribunal de Justiça, assim, aproveitando Recomendação do CNJ,
encaminhou para o Legislativo o projeto que fez nascer a 17ª Vara. A Unidade
Judiciária, então, se fez forte e, com a decisão do Supremo, permanece mais vigorosa
que nunca. Seus Juízes trabalham, desde o início, com casos difíceis,
envolvendo, tantas vezes, autoridades públicas e pessoas com influência
política e econômica. Sentem na pele, como qualquer Juiz Criminal sente, as
agruras do processo. Veem testemunhas sendo ameaçadas, verificam tentativas de
cooptação, amargam o sofrimento dos seus familiares, a desgraça das vítimas e a
apreensão extática da coletividade. Mas, precisam agir e o fazem quando
necessário. Mesmo contrariando os interesses escusos – não raro camuflados em
tecnicismos artificiosos para impressionar os incautos e servir de escudo aos
canalhas –, os magistrados prendem, julgam e condenam.
Não são melhores que ninguém por isso. Cumprem seu ofício, como
também cumprem quando soltam, julgam e absolvem. Se eles erram, resta o caminho infinito dos recursos. Se um ou
outro é autoritário, cabe a senda correicional. Nenhum deles é herói, tampouco
semideus, como querem alguns representar, ardilosamente, a ideia de autoridade
ínsita ao Juiz. São, sim, agentes públicos, expressão da soberania estatal,
detentores de uma função imprescindível à pacificação social. É por isso que se
exige respeito e não serão toleradas as críticas que derraparem para molecagem
ou tiverem o propósito de desabonar suas imagens.
A magistratura, toda ela, não está livre das avaliações
desfavoráveis, dos desacertos e até da prática de crimes, posto que feita de
homens. Mas, enquanto instituição, é uma garantia que necessita ser preservada
e qualquer um de nós dela pode precisar. Uma garantia para o próprio réu contra
a selvageria sanguinária da revolta popular, contra a vingança privada e as
milícias, contra a barbárie que insiste em permanecer entre nós e atinge mesmo,
suprema ironia, os criminosos de poder e o seu séquito falante.