É grave a situação por que passa Alagoas, isso sem considerar o pior: a concretude da perenização deste estado de coisas. Como se não bastasse a desordem do serviço público no município de Maceió, com ruas sujas, praças invadidas e fétidas, trânsito caótico, etc, etc, etc, o que já aflige, em demasia, a vida cotidiana dos cidadãos, surge, novamente, o problema da greve dos servidores públicos estaduais.
De logo, afirmo que não há como ser contra a utilização deste instrumento para os funcionários, porquanto assegurado, como direito, pela Constituição Federal. Parece-me que, como em muitos outros casos, o constituinte deslumbrado ante a queda da ditadura militar brasileira, estabeleceu uma série de prerrogativas sem medir conseqüências. Em democracias bem mais sólidas que o Brasil, como na Alemanha, a greve no serviço público é terminantemente proibida. E, nos Estados Unidos, há fortes restrições impostas, com possibilidades, inclusive, de prisão para os grevistas.
Entre nós, conforme já escrevi neste blog, a Carta Constitucional deixou para o legislador ordinário a regulamentação da greve no serviço púbico, o que nunca foi feito pelo letárgico legislador ordinário. E, mais uma vez, a questão foi endereçada ao Supremo Tribunal Federal, o qual sinaliza, já há algum tempo, para restrição no pertinente aos serviços considerados essenciais (Reclamação 6568/2009 ). Demais, é preciso firmar que, em relação aos militares, inclusive bombeiros, há proibição expressa na Constituição (142, §3º, IV: “ao militar são proibidas a sindicalização e a greve”).
É inegável o direito dos funcionários de reivindicar melhores condições de trabalho e, sobretudo, melhores vencimentos, ou ao menos, vencimentos compatíveis com as suas respectivas funções, corrigidos em razão da espiral inflacionária, que atendam, no mínimo, às necessidades básicas de uma família. No entanto, o instrumental para uma reivindicação de tal natureza não pode colidir, em nenhuma hipótese, com os direitos e interesses dos cidadãos. É que, no Estado Democrático de Direito, o conflito entre os direitos dos servidores e os direitos dos cidadãos resolve-se, sempre, em favor dos últimos. O direito do cidadão, do contribuinte, do povo a ter serviços prestados por funcionários do Estado é maior que direito de greve destes últimos.
Se a profissão escolhida não remunera bem, se o ente público não atende as expectativas, se o indivíduo acha que tem capacidade e possibilidade de ganhar mais, deve procurar a iniciativa privada. “A opção pela carreira pública é personalíssima, ninguém nela deve permanecer quando entenda lhe está sendo exigido demasiado sacrifício”. O servidor público, já se disse, “é um servidor da comunidade e não servidor de si mesmo”, seus direitos são estritamente condicionados aos seus deveres junto à sociedade.
A ausência de legislação regulamentadora, que se faz urgente, obriga ao poder público controlar as possibilidades de greve em cada caso concreto. Não é mais aceitável, porém, admitir a baderna protagonizada por grupos que atingem frontalmente os interesses do cidadão e da comunidade, tampouco ser complacente com o ócio de servidores que simplesmente cruzam os braços enquanto são pagos pelo combalido trabalhador brasileiro. Não é mais possível transigir com os pelegos em busca de cargos e outras vantagens pessoais, algo que permanece como uma praga em Alagoas. Não é mais admissível permitir a intromissão da politicagem que sustenta vantagens pessoais e eleitoreiras.
Por óbvio, os servidores não podem ficar a mercê de déspotas ou de administradores incompetentes. É fundamental que tenham amplo acesso e participação sobre a situação orçamentária e financeira do Estado, contando com rígidos mecanismos punitivos para os maus gestores, inclusive com a imprescritibilidade das infrações administrativas e dos crimes contra o erário por eles praticados. Todavia, já não se pode olvidar que o direito à greve, consoante se depreende de uma interpretação sistemática da Constituição, é um direito de defesa contra o Estado-Administração e não um direito de defesa contra o povo. Só nessa assertiva temos um bom começo para delinear seus limites e começar a impor duras penalidades aqueles que causarem danos à comunidade.